quarta-feira, 18 de novembro de 2009

A COMÉDIA DA VIDA PRIVADA

Hoje em dias as crianças que escutam da sua tia gorda: “Ah como ele é engraçadinho.”, o olho logo brilha e já pensa logo: “Vou largar a escola porque, sendo assim, eu já tenho profissão! Vou ser comediante de Stand Up.

Pensa numa mamata. O cara vai ao teatro com a roupa do corpo mesmo. Sem grandes produções. Ou de repente pra ele, ele ta produzido. Esses dias fui ver uma, o cara estava com uma dessas camisetas que tem um smoking desenhado, que por si só já é meio brega não é? Mas para melhorar (ou piorar) tinha um sinal de negativo e um de positivo em cima. Tudo bem, dou-lhes uns segundos para refletirem. E então? Chegaram a alguma conclusão da camiseta do rapaz? Enfim.

Mas continuando, o sujeito vai lá, sem nem precisar de um cenário e começa falar um monte de besteiras. Já reparou que eles têm sempre que tornar uma coisa normal, desconexa? Fazem uma ligação louca ou dúbia de uma coisa com a outra. E as pessoas riem do absurdo que seja. Exemplo: “OMO MULTIAÇÃO para lavar a alma do São Paulino” . E as pessoas riem.

Todo comediante de stand up tem twitter. E, por vezes, não há nada mais irritante do que twittes de comediante de stand up. Porque o cara acha que ele tem que ser engraçado o tempo inteiro, e aí começa a fazer comentários de coisas que não são para ter graça: “O que? Caiu o minhocão? Ah antes o de lá, do que o meu!”.

Acho que o maior medo desses comediantes é de não fazerem ninguém rir. Mas isso também é quase impossível, porque sempre tem um “foda-se” para salvar. Ele conta uma piada, ninguém se manifesta. Aí ele diz: “Não vão rir? Foda-se, já pagaram ingresso mesmo”.

E na platéia desses espetáculos? Sempre tem aquele mala que se acha mais engraçado que o próprio comediante, e aproveita as brechas do silêncio para fazer um comentário em voz alta. Estapafúrdio na maioria das vezes. Por exemplo, quando quer mostrar que não achou graça na piada e ainda usar um termo da moda: “Nossa, ri litros agora”. E o comediante devolve: “Ah meu querido, você baba quando ri?”.

Fico pensando se esses comediantes comem alguém. Porque pensa, tirar a roupa para um cara desse deve ser o mesmo que doar sua vida para público. Quem me garante que ele não vai dizer em teatro lotado que tem um peito maior que o outro. Ou então que você geme como ambulância no cio (lembra do que eu falei no começo de juntar assuntos em uma ligação desconexa?).

Ou seja, o cara que faz stand up, é só mais um cara que tem a cara de pau o suficiente de rir da desgraça alheia, ou que faz da sua própria desgraça uma piada. Que abusa de frases feitas, que você ta cansado de ouvir, o final da piada é sempre obvio, mas acaba rindo porque neste caso, até rir é obvio. É o cara que vai sempre pegar um pra cristo e dizer que ele só come alguém porque tem dinheiro. Ele vai sempre falar da última atualidade em tom de gracinha (ex: Hoje eu to feliz, vi que existe algo menor que meu pau, a saia da Geyse). Resumindo, é o cara que se nada mais der certo ele sabe que ainda pode virar comediante.

O que? Achou esse texto irrelevante? Foda-se, daqui 15 dias eu volto, você queira ou não. Zagallo que sabe das coisas.

quarta-feira, 4 de novembro de 2009



A CABANA

A Cabana é assim que nem coração de mãe. Sempre cabe mais um. Só quem já morou em república sabe como é isto. Porque república você sabe, do latim Res publica “coisa pública”. Ou seja, é um vuco-vuco, um muvucado, um “é só chegar e ficar avontz”.

Sou a moradora mais antiga da Cabana. E talvez por isso a mãe da história. A que cuida. Que pergunta se já comeu. Que pergunta se não vai por blusa. Ou se ta usando camisinha. Sim, eu sou uma mãe moderna.

Por aqui já se passaram diversas personalidades. Uma mais interessante que a outra. Já se passaram histórias de vida que me fizeram rir e chorar, cada uma com seu detalhe peculiar.

Tinha uma que comia por etapas. Ela fazia o prato de estivador do porto dela, e ia comendo aos pouquinhos. Comia um pouquinho, guardava no microondas. Daqui a pouco estava ela de novo com o prato na mão, comendo mais um pouquinho. Parava. Descansava. E lá vamos nós, comer mais um pouco. Tenho ódio dela, não engorda uma grama. NUNCA!

Tivemos também uma boêmia por aqui... Eram 03 horas da manhã, todas as pessoas do “horário normal de vida” dormindo, e lá vinha ela, chegando caindo, derrubando as coisas, levantando as mãos e dizendo: “Eu não to bebazzaa. Eu juro, não to não.” Uma vez ela assoprou o edredom achando que ele estava em brasa. Vou falar o que? Cada um com seu edredom e todos na sua.

Por aqui passou também a politicamente correta. “Vamos reciclar o lixo”. “Vamos fazer caminhada pela paz”. “Vamos salvar as baleias!”. Ela era praticamente a sindica da Cabana. Organizava reuniões para debater tópicos, do tipo: “Vamos decidir quem lava o banheiro esta semana.” Sinto falta dela na verdade, depois dela meu banheiro nunca mais foi o mesmo.

A Cabana já teve um morador “autista”, o mundo podia cair. O barraco rolar. O ET de Varginha dançar um tcha tcha tcha na sala. Que nada, mas nada o tirava do mundo paralelo em que ele vivia. Era preciso chamá-lo diversas vezes, para que ele reparasse em algo...

Uma grávida, também, esteve na Cabana. Oh Deus nos acuda! “Menina pelo amor de Deus não inventa de arrastar sofá”. “Larga esse copo de vinho, o que ta fazendo com isso na mão?”. E compra roupa do São Paulo, não compra roupa do Palmeiras! E de repente, nesta época todo mundo virou tio.

Ah já foram tantos os moradores. Tinha uma que o mundo podia acabar, desde que no seu final tivesse batatinhas para comer. Tinha (ou melhor: tem) o fantasma da casa, que é a Chinesinha. Uma japonesa (se a minha japonesa, tem o nome de Chinesinha, vocês não tem a ver com isso) que vive aprisionada numa xícara de porcelana e as vezes ela pega as coisas e some com elas por uns dias. Teve a moradora que para tudo ela tinha uma dor e um remédio. E três vezes na semana ela tinha que dizer: “Ai eu acho que vou adoecer.”

E os amigos dos moradores? Já entrei em casa e achei que tinha ultrapassado o portal do tempo e fui para o Woodstock. Tinham alguns hippies pela sala. Já entrei aqui e encontrei a galera do metal. Assim como já achei que o próprio Caetano Veloso estaria por aqui, porque encontrei aquela galera do violão que é linda ou não...

Morar em república é definitivamente aprendizado de vida. É aprender compartilhar. A ceder. A impor-se. Mas principalmente a amar. Cada um do seu jeito e forma. Com seu defeito e qualidade. Com seu barulho ou seu silêncio. Por isso, tenho certeza, só quem conhece a Cabana, sabe o que é estar aqui. Que seja então sempre assim, eterna (e especial) enquanto dure.


PS: Cabana, é porque originalmente seria a Casa da Aline, da Bruna e da Ana.