quarta-feira, 28 de julho de 2010

O SEQUESTRO AMIGO

Talvez Joanna Lyvia não se desse conta o que exatamente era morar em São Paulo. Porque para ela os dias seguiam iguais, por mais, que os jornais noticiassem todos os dias tragédias. Tudo era uma realidade bastante distante que pertencia só ao Datena, Cidade Alerta e esses programas sensacionalistas do mundo do crime.

Estava saindo do seu trabalho e como de costume seu amigo, Jacinto Leudimar, ofereceu-lhe carona. Moravam próximos e a conversa no carro ajudava a aliviar a tensão do trânsito.

Tudo transcorria tranqüilo como sempre, até o farol de uma rua um tanto quanto deserta fechar... Foi quando o carro deles foi abordado por dois homens.

E, desde então, foi uma sucessão de gritos e susto.

- Vá pra lá, vá pra lá, passa pra trás, passa, eu te desço berro maluco, faz o que eu to mandando, faz logo porra!

Praticamente jogaram Joanna Lyvia para o banco de traz, e enquanto um tomava a direção do Jacinto Leudimar, o outro se posicionava ao lado dela.

- Ae, irmão, a parada é a seguinte, a gente só que dinheiro falow? Não quero machucá ninguém, não queremo nada alem de grana, firmeza?

Enquanto o que dirigia falava, o outro já estava a mexer na mochila de Joanna Lyvia.

- Ah mas perae, meu brother, olha isso aqui – tirou de dentro da mochila um monte de maquiagens e um perfume novo. – Mas minha neguinha vai ficar muito cheirosa desse jeito. Qual é tua graça moça?

- Joanna Lyvia. – Ela falou num fio de voz com muito medo de tudo que estaria por vir.

- Então Joanninha, a parada era essa memo, só queríamos grana, mas não vai dar pra ficar vacilando com esses podrutos aqui né não? Minha nega vai ficar é feliz hoje. É hoje que eu me dou bem Farinha.

- Hey, levem logo o dinheiro só libera a gente...

- Calma ae, irmão, vamo saca o dinheiro lá nas quebrada, ta achando que a gente é otário??? Vai tirar o dinheiro na frente de bacana??? Calma ae. Tamo de boa aqui, ninguém vai machuca vocês. A gente só ta fazendo nosso corre, segunda-feira temo que dá 30 mil pau pros coxinhas mano. Ta achando que é brincadeira? O baguio é doido rapá. Se não moía a mão dos homi eles pega nois de novo.

- Vocês vão pagar a policia para ficarem livres? – Joanna Lyvia não conteve a pergunta

- Manow cê é loca? Aquilo lá é podridão veio. Quem não faz o corre acorda com formiga na boca! Se acha memo que a gente gosta dessa vida? Mas emprego a gente não arruma sendo que já fomo cadeiero, e aí? A neguinha ta La em casa esperando pra dar de come pros muleke, manow.

O outro só ouvia e se dirigia em silêncio para a “quebrada”, até que resolveu falar.

- Seguinte, nois não é ruim, ta ligado? Ruim é o sistema. Ruim é o governo que não da oportunidade pra quem que trabalha, se você tem dinheiro você trabalha, se não tem, você se fode. Nois ta no corre por isso ae. E olha só, vocês não podem fazer isso aí que vocês fizeram. Fica vacilando em São Paulo, manow? Ta louco? Não pode da uma brecha dessa. Eu, por mim, nem queria leva a grana de vocês, tão aí de boa, não reagiram, mó parceria de confiança, mas vocês entendem nosso corre né? Se vacilar, a gente tem que abordar a vitima memo. Faz aquela cara de mano mau e vamo que vamo. – Neste momento ele fez a cara idêntica da aborgem.

- Pode crer... A globo ta de perdendo heim? – Jacinto Leudimar pensativo acabou concordando distraido. E recebeu um sorriso satisfatório do ladrão.

- Como parceria de confiança? Vocês estão nos roubando! Não posso confiar... – Joanna Lyvia ainda era sã.

- Poxa, faz sentido... – O ladrão ao seu lado também concordou distraído.

A conversa transcorreu ainda por mais uns 40 minutos. Contaram como eram feitos os crimes, a forma de abordagem, da “neguinha”, dos “muleke”, de como foi na cadeia... Até que chegaram ao caixa, pegaram todo o dinheiro que tinha na conta deles, se despediram recomendando-os para não vacilar mais. E ainda na despedida, lamentou-se:

- Pena que a gente se conheceu nessa pegada, porque se não irmão, agente seria até brother heim.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

SÓ CASANDO!

Juliany Ferdinanda estava deitada na sua cama, com seu pijama Cor de rosa, as pernas pra cima e falando no telefone:

- Ai “abigãã” cansei sabe? Cansei! Eu quero amar alguém de verdade. Eu já estou numa idade que não posso mais brincar de delivery! Ligar para “aquele amigo” disponível e me satisfazer apenas. O ultimo que chamei, o Lucão, veio me dizer: ‘ Ai Ferdy borá colá numa rave nesse findi veio”. “Véio” abigã?? Veio é corno do pai dele! “Colá” numa rave?? Vê se eu tenho idade pra isso... Eu preciso ser convidada para jantares, para exposições, para lançamentos de livros. Não pra colá na rave!

Juliany Ferdinanda ficou em silencio por uns segundos escutando algo que sua interlocutora lhe dizia.

- E não é abigã? Não dá mais pra mim. Preciso estrutarar minha vida. Preciso ter paz. Não preciso mais de “paus amigos”. Preciso de conta bancaria amiga. Estabilidade amiga. Companherismo amigo. Na alegria e na tristeza. Sabe? Não os mesmos “é o que tem pra hoje” da vida!!!

Fez-se mais um momento de pausa. Juliany aproveitou para analisar se o esmalte do pé já precisava ser trocado, enquanto ouvia a opinião de sua amiga.

- Pois então, é isso mesmo, a gente tem que sacudir, senão o tempo passa abigã e baw baw! Never More! Eu não vejo a hora abigã, mas não vejo mesmo sabe do que? Adivinha. – houve uma parada dramática, daquelas do tipo que não é para pessoa exatamente responder, é apenas para que fique mais curiosa. – Do primeiro beijo!!!!! Você lembra abigããã! Lembra como é a sensação?? Conhecer alguém novo, aquele olhar tímido, aquela palavra de incentivo velada, a respiração que falha e então... O PRIMEIRO BEIJO! Aiii frio na barriga só de pensar abigã. Explorar uma boca diferente... como é que beija. Uiii me dá coisinhas. Ai abigã, acho que vou ligar pro Lucão essa semana, acho que to precisando. Mas foco, abigã. F O C O ! Nada mais de casinhos antigos que não nos levam a lugar nenhum. Agora que romance que me leve a algum lugar. Leve-me a Paris, por exemplo!

Mais uma vez Juliany Ferdinanda calou-se e deixou que sua amiga falasse. E enquanto concordava balançando a cabeça para o que escutava, também procurava pontas duplas em seu cabelo...

- Ah abigã... Eu sei que o negocio agora é renovar. Não, eu não vou mais ficar com os mesmos caras que me enchem o saco há tanto tempo e não me assumem e não me amam. Não se importam de verdade comigo! Só por que são gostosos? Só porque tem pegada? Ai e que pegada né abigã, meu Deus, tremo só de pensar na mão do Lucão. Aiiiiii FOCO abigã, vamos FOCAR! Vou pedir pra minha mãe rezar com mais ênfase pra que me arrumem um homem bom! Apesar de quem gosta de homem bom é seminário né? Mulher tem o defeito imenso de gostar de homem que não presta. Mas eu vou mudar abigã, eu vou mudar. Escreve aí! E não é pra escrever a lápis não... Escreve a caneta tinteiro minha querida!

Deixou mais uma vez sua interlocutora falar e enquanto isso retirou as bagunças de cima da sua cama... Riu alto e voltou a dizer:

- Escreve, to te falando, escreve que a partir de agora Juliany Ferdinanda só fica se for pra casar! Agora deixa eu ir domir abigã... Vou amanhã as 06hs andar de bicicleta no parque. – ficou muda por um minuto e tornou a responder – Como pra que abigã? Já esteve num parque bem cedo? Minha querida acorda pra vida. Parque bem cedinho é o que há! Só os médicos correndo. Os advogados andando de bicicleta. Os engenheiros fazendo caminhada, meu bem! Parque a tarde só tem vagabundo, mas de manhã só pretendente forte a marido!!! Abre o olho amiga, abre o olho que eu to te dando essa letra de bandeja heim...