quarta-feira, 20 de outubro de 2010

CURRICULUM VITAE DE MERDAM

Lá estava ela em frente a sua possível empregadora nova. Não tinha muita prática em deixar de ser ela mesma, sendo assim, fosse o que Deus quisesse. Não ia fazer tipo. Nem medir as palavras. Nem concordar com nada quando fosse apenas para agradar. Enfim, como disse, sem o menor talento para atriz.

Era a primeira vez que ela se encontrava nessa situação. Empregos sempre brotaram a sua porta sem que ela precisasse ser entrevistada. A única entrevista que ela imaginava em sua vida era a do Jô (Soares, sabe?). Sim, um dia ela iria sentar naquele sofá e falar do seu livro. Mas isso é outra história, vamos voltar a entrevista.

A empregadora a olhou de modo simpático e disse sem reservas, que não estava concentrada na conversa, estava pensando em mil coisas. Pensou automaticamente: “Vamos nos dar as mãos!” e quando externou o pensamento, a mulher suspirou aliviada e silenciosamente agradecida por ela a compreender. E então, disse que abriria seu currículo para focar nela e automaticamente, desta vez, pensou: “Ferrou.”.

Por que ferrou? Porque currículo, na sua humilde opinião é balela. Muita ladainha para pouco feito. Não que o currículo dela esteja mentindo em algo. Não está. E talvez seja justamente por isso, que de repente não estava atrativo. Currículo para ela é conto de fadas, acredita na historinha quem quer. O que vale mesmo é a experiência de vida. E esta ela tinha bem.

Tinha varias graduações em sua vida. Em diversos cursos. “Como se recuperar pós rebeldia adolescente.” , “Supere mudança de cidades, amigos e vida”, “Amores que vem e vão.” com especialidade em “Feridas que se fecham.” , cursou também “Pedras no caminho, obstáculos que você pode e deve ultrapassar.” E ainda, um curso de economia bem importante: “Como sobreviver quando seu salário acaba no meio do mês?”. Sua experiência de vida ia bem além das palavras difíceis copiadas de internet que se tem em um currículo.

Ela acreditava nisso. Na sua capacidade. Sua vivência. E não ia fingir ser intelectual. Muito mais que “ter” diploma. Ela “era” o conhecimento pratico. Não que desmerecesse aos que estudam. Obvio, que não. Mas desmerecia a falta de ponderação. Há casos e casos. E em certos casos, uma faculdade não diz nada.

Havia enviado seu currículo aquela empresa na tarde anterior e muito rápido foi chamada para conversar, logo no dia seguinte. Mais rápido ainda se passou o tempo da entrevista, apesar dela ter ficado uma hora lá respondendo todas as perguntas sem pestanejar. Ela se sentiu realmente bem no ambiente, sentiu-se aconchegada. A entrevista (aquela que foi a primeira em sua vida!) levou um rumo descontraído e de entendimento mutuo. A empregadora informou-a no final da conversa que recebeu em torno de 400 currículos, que já havia entrevistado outras pessoas e que tomaria sua decisão após 3 dias, logo assim ela seria comunicada na data estipulada. Ao se despedirem ela ainda arriscou uma despedida ousada: “Nos vemos semana que vem então.” A empregadora sorriu e não pode deixar de dizer: “Vou torcer!”

Duas horas depois, ela recebia um telefonema informando-a que a vaga era sua. Segunda – feira, próxima, começa sua nova vida e mais um “capitulo” do seu currículo será escrito.



terça-feira, 5 de outubro de 2010

ELEIÇÕES, DESAVENÇAS E PIZZA

Julie Anete sabia que corria o risco, que a possibilidade era grande, mas ainda assim preferiu torcer contra. Preferiu rezar (em vão) até o último minuto que isto não acontecesse. Bobagem a dela. O destino era certo. E lá estava ela, novamente de frente ao seu ex marido.

- Ora, ora quem eu vejo... – disse ele no tom sarcástico costumeiro, o mesmo que fez minar o seu casamento.

- Achei que fosse transferir seu titulo de eleitor para perto da casa da sua mãezinha Jacinto Benedito.

Lá estavam os dois no dia da eleição, ele saindo da sessão enquanto ela aguardava para votar. Pois, desde que se casaram e compraram o apartamento (hoje, habitado só por ela) transferiram seus títulos para a escola mais próxima e por algumas vezes fizeram o ato de cidadania juntos. Ela achava até mesmo romântico o fato de votarem na mesma sessão.

- Eu não transferi meu titulo, meu bem, porque o apartamento ainda é meu, e eu posso qualquer hora voltar a morar aqui também.

- Só por cima do meu cadáver, meu querido!

- Ah é desse jeito mesmo, provavelmente. Mas deixemos de lado... Sabe que seu candidato vai perder até para a mulher da onda verde não é? E, por favor, quem é essa mulher na balada??? Ninguém nem sabia quem era até ontem!

- Não faça eu perder meu tempo com suas bobagens, Jacinto Benedito. Antes uma “desconhecida” do que uma criminosa não é? Ou você, é um alienado que desconhece o passado da sua candidata? Que ela é uma guerrilheira, assaltante de banco, mandante de seqüestro. Já ouviu falar na revista Veja, meu amor, ou só as “figurinhas” da Playboy são a sua “leitura”?

- Antes uma mulher que luta de acordo aos seus princípios, do que a bichisse de um homem que corre e vai estudar no exterior quando tudo em seu pais está o caos.

- Já ouviu dizer que quem briga perde a razão? Enquanto sua candidata cometeu atos horrorosos, o meu candidato se preparava melhor para dar um futuro de bem a nossa nação. S – E – M P – R – E – C – I – S – A – R B – R – I – G – R – A – R . De forma inteligente, coisa, que você jamais compreenderá.

- A minha candidata querida, é exaltada no nordeste, pelo excelente trabalho que o governo faz por lá.

- Excelente trabalho, traduzindo, a boa vida do dinheiro fácil, sem que precisem trabalhar. Sabe que até eu penso em me mudar pro nordeste às vezes?

- Eu acharia ótimo! Finalmente poderia voltar para meu apartamento.

- Nosso apartamento Jacinto Benedito! Nosso.

- Estão te chamando, vá lá dar voto perdido no seu candidatinho de mierda.

- Oh quantos argumentos inteligentes meu bem... Você realmente me impressiona!

- Hey, por falar, em impressionante, tenho ingressos para o Bon Jovi essa semana, quer ir comigo? – por um momento até um certo brilho pousou nos olhos dele.

- Bon Jovi Bene?

- “Will love you, babe, always” – Ele cantarolou a musica Always.

- A nossa musica… Bene…

- PROXIMOOO. – uma mesaria irritada falou na porta enquanto observava os dois.

- Podemos comer uma pizza depois do show... e conversar um pouco. Sei lá, estava imaginando isso...

- Faz assim, me liga?

- Está bem. Nos falamos amanhã então.

Dito isso, ela seguiu para votar, e ele rumou para saída. E enquanto isso, a mesaria que havia ouvido a conversa praticamente inteira pensava... “Política é sempre assim no final todo mundo dança e acaba em pizza...”